Análise econômica da responsabilidade extracontratual no direito do trabalho

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No artigo “Direito e economia: responsabilidade extracontratual e a reforma trabalhista” (acesse aqui) o Juiz do Trabalho do TRT da 9 Região, Alan Bernardo dos Santos, avalia as repercussões econômicas do regime de responsabilidade civil extracontratual após a Lei 13.467/17. O objetivo do trabalho é investigar o impacto da reforma trabalhista nos julgados sobre a responsabilidade civil do empregador, com ênfase nos desdobramentos econômicos em pequenas e médias empresas. 


O autor inicia o texto estabelecendo como premissas algumas definições relevantes para compreender a relação entre direito e economia. Gustavo Kloh entende que, sob perspectiva econômica, o Direito tem o papel de integração social, de busca da realização de ideais de ordem, segurança, justiça social e desenvolvimento, interagindo com a realidade social e atuando, dialeticamente, como estrutura e função, harmonizando interesses e servindo como ferramenta para a realização de determinados fins1. Desse modo, a Análise Econômica do Direito (AED) é um “método de estudo da teoria econômica relativamente a estruturação, formação impacto e consequências de eventual aplicação de instituições jurídicas e textos normativos”2. Portanto, o artigo conclui que “o Direito interfere indiretamente na economia das empresas, mormente naquelas de menor porte, que eventualmente não são capazes de suportar as condenações que lhes são impostas.”3 


O texto, então, segue estabelecendo a distinção entre despesas que são previstas pelo empregador e despesas extraordinárias. Contratos com pessoas físicas e jurídicas que lhe prestem serviço e até mesmo o risco que determinada empresa assume ao não cumprir a legislação trabalhista são considerados despesas previsíveis ao empregador. Inclusive ser preferível para o empregador incorrer no risco jurídico de descumprir a legislação trabalhista, porque muitas vezes o trabalhador não aciona a Justiça do Trabalho por medo de retaliações e até pelo decurso do prazo prescricional. Entretanto, despesas que vão além do contrato de trabalho se inserem no campo do extraordinário. Por exemplo, é provável que uma empresa não considere entre suas previsões econômicas um condenação judicial à indenização de um trabalhador que se envolva em um acidente de trabalho específico e, por conseguinte adquira sequelas que o impossibilitem de exercer sua profissão. O impacto econômico de uma condenação como essa pode atualmente chegar ao montante de meio milhão de reais, valor que poderia ser absorvido por uma indústria ou por uma instituição financeira, mas que levaria uma pequena empresa à falência. 


Ademais, a indenização, como regra, busca a restituição integral do dano sofrido pela vítima. Contudo, nem sempre esse dano é quantificável, tampouco é possível que as partes retornem ao status quo ante. Por exemplo, há hipóteses em que a saúde da vítima pode ser plenamente reestabelecida e nesses casos, a condenação é limitada ao valor dos tratamentos necessários, como dano material. Em outros casos, é possível que o dano causado à saúde seja irreversível, levando à redução permanente da capacidade laborativa. A solução, nesses casos, é aumentar o valor da indenização pecuniária de maneira que o agente se torne indiferente entre sua posição final e a posição anterior ao acidente. 
Nesse contexto, a reforma trabalhista (Lei 13.467/17) trouxe profundas alterações ao regime da responsabilidade trabalhista extracontratual. O diploma normativo determinou que apenas os dispositivos elencados no título da responsabilidade extracontratual seriam aplicáveis às relações de trabalho, afastando, definitivamente, a utilização do Código Civil como fundamento das decisões trabalhistas. Além disso, embora não haja uma interpretação definitiva dos tribunais trabalhistas sobre o tema, pode-se sustentar que o art. 223-C definiu taxativamente os bens jurídicos tutelados inerentes às pessoas físicas. Nos parágrafos do art. 223-G, fixou-se, também, uma controversa tarifação dos danos morais, conforme a natureza da ofensa, tendo como parâmetro o último salário do trabalhador. 


O texto prossegue, salientando a desproporção dos efeitos da condenação para os diferentes empregadores e os desdobramentos desses efeitos no caráter pedagógico do dano moral trabalhista:

 

Tratando-se de uma quitanda ou de uma multinacional, a indenização será a mesma, o que pode soar um tanto estranho e desproporcional não só para a classe da magistratura, como também para as próprias empresas, que, em tese, teriam sido as beneficiadas pela reforma em comento. Com efeito, trata-se do caráter pedagógico da medida, que passará despercebido pela multinacional ao ser condenada em três vezes o último salário contratual (que nem mesmo inclui as demais parcelas remuneratórias) do ofendido. 
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Portanto, o Juiz do Trabalho Alan Bernardo dos Santos demonstra através de seu trabalho que a Análise Econômica do Direito (AED) é uma metodologia importante para produzir análises críticas sobre alterações legislativas. Ao avaliar as mudanças introduzidas pela reforma trabalhista, o autor utilizou a AED para compreender os efeitos práticos nas relações de trabalho. Inclusive, investigando os possíveis interesses que foram favorecidos pela reforma trabalhista, através da análise das consequências da aplicação dos novos institutos introduzidos na reforma, como a tarifação do dano moral. 

 

Raphael Ferreira Santana Silva, 20/05/2022

 

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* Obtenha aqui acesso ao artigo do juiz do trabalho Alan Bernardo dos Santos.

1. KLOH, Gustavo . Teoria econômica da propriedade e dos contratos . In: PINHEIRO, Armando Castela; PORTO, Armando Maristrello; SAMPAIO, Patrícia R . Pinheiro (org .) . Direito e economia: diálogos. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2019.

2. Ibidem.

3. SANTOS, A. B. Direito e economia: responsabilidade extracontratual e a reforma trabalhista. In: PINHEIRO, A. C.; PORTO, A. J. M.; SAMPAIO, P.R.P. (Eds.). Temas em Direito e Economia do Trabalho 2021, p. 68.

4. Ibidem, p. 85.